Lei da Família Acolhedora reconhecida após 9 anos em Goiânia
À espera desde 2009, programa é sancionado pela Prefeitura após pedido do MP-GO
Nove anos depois da aprovação da Lei federal 12.010, em 2009, a Prefeitura de Goiânia sancionou a legislação municipal que institui o programa Família Acolhedora. No documento da União, a previsão de que as famílias pudessem se cadastrar para receber crianças ou adolescentes em situação de risco emergencial por até 18 meses foi incluído no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas era necessário sua execução.
O Ministério Público Estadual de Goiás (MP-GO) encabeçou as discussões para que a legislação passasse a existir na capital. O coordenador do Centro de Apoio Operacional (CAO) da Infância e Juventude do MP-GO, promotor Publius Lentulus Alves da Rocha, foi responsável por levar o pleito até o prefeito Iris Rezende (MDB) e elaborou a minuta do projeto de lei, conversada com a Procuradoria-Geral do Município (PGM). Rocha também conversou com vereadores pela celeridade na aprovação do projeto de lei, o que ocorreu no início de outubro.
O promotor reconhece, no entanto, que em um primeiro momento o Família Acolhedora deve sofrer preconceito ou mesmo problemas para ser entendido. “É um instituto diferente da adoção e também do apadrinhamento afetivo. A ideia é que se coloque em uma família uma criança que tem a necessidade emergencial por ter tido o afastamento do lar pela Justiça, não são casos que já estão acolhidos em abrigos ou prontos para a adoção”, explica. Secretário da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas), Robson Azevedo, afirma que se trata de uma maneira de desistitucionalizar o acolhimento, em que os abrigos são entendidos como impessoais.
“O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) estabeleceu as normas, mas para que o programa funcione tem de ter a lei municipal. Foram passando as gestões e não andou, não sei dizer a razão. Nós estimulamos que se fizesse a lei, em parceria com o MP”, conta Azevedo. O secretário acredita que o cadastramento das famílias deve ser iniciado no começo de 2019, pois até lá será realizada a capacitação dos servidores que vão atuar e coordenar o programa. Para participar, é necessário ser residente em Goiânia, possuir pelo menos um dos membros familiares com mais de 21 anos e apresentar boas condições morais e de saúde física e mental, ou seja, que nenhum membro familiar tenha problemas psiquiátricos ou de dependência de substâncias psicoativas.
Bolsa
É então realizado um estudo psicossocial da família pela equipe técnica da Semas para que seja concluído o cadastro. É o Poder Judiciário quem determina a pessoa e o período em que esta vai ficar na família acolhedora. Ao mesmo tempo, esta família recebe uma bolsa da Prefeitura no valor de um salário mínimo por mês de permanência da pessoa acolhida. Esse valor é válido para cada criança de saúde.
Azevedo explica que, por restrições orçamentárias, a lei instituiu que o município possa arcar com até 216 bolsas, ou seja, para essa mesma quantidade de acolhimentos. “Podemos aumentar isso depois, com suplementos orçamentários, mas a gente tem esse limite e até por isso temos de começar no ano que vem, pois neste ano não temos mais orçamento”, explica o secretário. O promotor Rocha arma que o número já é suficiente. Segundo ele, atualmente há entre 100 e 150 crianças e adolescentes em abrigos que entrariam na situação da família acolhedora. “Se o programa já existisse antes, teríamos todas essas crianças em um ambiente familiar em Goiânia”, diz.
Programa atua em rede com demais profissionais
A crítica comum ao programa de Família Acolhedora em relação ao possível vínculo formado entre a família e a criança acolhida, o que poderia causar problemas com o afastamento, é relativizada pelo secretário da Secretaria Municipal de Assistência dela”, diz.
Azevedo explica que assistentes sociais e psicólogos da Prefeitura e do Poder Judiciário atuam em conjunto e acompanhando a situação da pessoa acolhida e da família, de modo que ambos os lados tenham a compreensão da situação e de que vai ocorrer o afastamento. “Mas vai continuar existindo ali uma amizade, algum vínculo, com o qual essas pessoas vão poder contar e seguir. Por mais que tenhamos problemas pontuais, nós esperamos que os psicólogos e a Justiça estejam preparados para isso.”
O secretário conta que desde a sanção da lei, no início desta semana, várias famílias já ligaram na Semas desejando se informar sobre o programa. “Ainda não sabemos dizer se estão mesmo interessadas, se vão se cadastrar, ou se estão confundindo com o apadrinhamento e a adoção, o que vai ser bem explicado depois. Mas já temos visto interessados e contamos com a solidariedade do povo goianiense para este programa”, diz.
Segundo a lei, “toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar terá sua situação reavaliada, no máximo, a acolhida na família, para então decidir “de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou pela colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas”
3 perguntas para Publius Rocha
1 – Há críticas sobre o Família Acolhedora, que criaria um vínculo entre a pessoa acolhida e quem a recebe. Como funciona o programa?
É melhor ter o vínculo familiar do que com uma instituição. Se uma família for usar o programa para uma adoção, vai sair frustrada, porque ela vai ter que entrar com todo o processo de adoção, na la. Aquela criança não está pronta para a adoção também.
2 – Após os 18 meses, que é o tempo máximo de acolhimento, o que ocorre com a criança?
Após os 18 meses, havendo a possibilidade, ela deve voltar ao vínculo familiar natural. Todo caso é analisado, mas a preferência é a família natural.
3 – Se não for possível, é encaminhado para uma instituição ou abrigo?
Não. São casos que ainda vão surgir, quando o programa estiver implantado. Quem está em um abrigo, já está acolhido transitoriamente, que é a mesma ideia da Família Acolhedora. Mas o entendimento é que é preferível estar em uma família, em que o desenvolvimento é melhor.
Fonte: Jornal O Popular/Vandré Abreu